Liderança é diálogo




Por Michael Slind, Boris Groysberg

Como aumentar o envolvimento e o alinhamento do pessoal na organização moderna, mais horizontal e interligada.

A abordagem centralizada à gestão — o famoso “comando e controle” — ficou cada vez menos viável nos últimos anos. Globalização, novas tecnologias e mudanças no modo como a empresa cria valor e interage com clientes reduziram drasticamente a eficácia de um modelo de liderança puramente impositivo e vertical. No lugar dele, o que virá? Parte da resposta está no modo como o líder gerencia a comunicação na organização — ou seja, como conduz o fluxo de informação de, para e entre trabalhadores. A comunicação empresarial tradicional deve dar lugar a um processo mais dinâmico e sofisticado. E o mais importante: esse processo deve ser fundado no diálogo.

Chegamos a esta conclusão no decorrer de um projeto recente de pesquisa focado no estado da comunicação organizacional no século 21. Ao longo de mais de dois anos, entrevistamos profissionais da comunicação e altos dirigentes de uma série de organizações — grandes e pequenas, blue-chips e start-ups, com e sem fins lucrativos, americanas ou não. Até aqui, já falamos com cerca de 150 pessoas em mais de cem empresas. Participantes do estudo mencionaram, de forma explícita e implícita, iniciativas no sentido de “manter um diálogo” com o pessoal ou a ambição de “fazer a discussão avançar” na empresa. Com base em insights e exemplos colhidos na pesquisa, criamos um modelo de liderança que chamamos de “diálogo organizacional”.

Descobrimos que, hoje em dia, a forma de contato do líder inteligente com o trabalhador é mais parecida a uma conversa comum entre duas pessoas do que a uma série de ordens disparadas do alto. Além disso, o líder adota práticas e promove normas culturais que infundem a organização inteira de uma predisposição para o diálogo. A maior vantagem dessa abordagem é permitir que uma empresa grande ou em crescimento funcione como se fosse pequena. Ao falar com o pessoal, em vez de simplesmente dar ordens, o líder pode manter ou recuperar alguns dos atributos — flexibilidade operacional, alto grau de envolvimento dos funcionários, forte alinhamento estratégico — que permitem a empresinhas novas bater rivais mais estabelecidas.

Ao desenvolvermos nosso modelo, identificamos quatro elementos do diálogo organizacional que refletem atributos essenciais da conversa interpessoal: intimidade, interatividade, inclusão e intencionalidade. Um líder que conduz a organização com práticas fundadas no diálogo não precisa (necessariamente) satisfazer esses quatro requisitos. Contudo, conforme descobrimos na pesquisa, esses elementos tendem a se reforçar mutuamente. No final, convergem para um processo único, integrado.





Intimidade: aproxime-se do pessoal

Para que o diálogo entre as pessoas floresça, deve haver proximidade entre os envolvidos, tanto no sentido figurado como no literal. O diálogo organizacional também exige que o líder minimize a distância — institucional, comportamental e, às vezes, espacial — que normalmente o separa de trabalhadores. Onde impera a intimidade do diálogo, gente com poder de decisão busca e conquista a confiança (e, com isso, a atenção) daqueles que trabalham sob sua autoridade. Para tanto, cultiva a arte de ouvir indivíduos em todos os níveis da organização e aprende a falar com trabalhadores de forma direta e autêntica. A proximidade física entre líderes e trabalhadores nem sempre é viável. Tampouco é essencial. O que é essencial é a proximidade mental ou emocional. Um líder adepto do diálogo desce do trono empresarial e encara o desafio de se comunicar de forma pessoal e transparente com os trabalhadores.

Essa intimidade distingue o diálogo organizacional de velhas e tradicionais formas de comunicação na empresa. Em vez da distribuição de informações do alto para baixo, o foco passa a ser a troca de ideias de baixo para cima. O tom é menos corporativo, a troca é mais informal. E tem menos a ver com dar e receber ordens do que com fazer e responder perguntas.

A intimidade do diálogo pode se manifestar de várias maneiras. Conquistar confiança, saber ouvir e entrar no campo pessoal são algumas delas.

Conquistar confiança. Sem confiança, não pode haver intimidade. Para efeitos práticos, o inverso também é verdade. Ninguém vai participar de uma troca sincera de opinião com alguém que pareça ter uma agenda oculta ou se mostre hostil. E qualquer conversa que ocorra entre duas pessoas só será gratificante e relevante se os envolvidos acreditarem que a pessoa a sua frente realmente é quem parece ser.

Mas é difícil chegar a essa confiança. Em organizações, o pessoal sente particular dificuldade em depositar sua fé em líderes — que só conquistarão essa confiança se forem autênticos e diretos. Isso pode significar abordar temas considerados tabu, como dados financeiros de caráter delicado.

A americana Athenahealth, provedora de tecnologias de prontuário médico, chega ao ponto de tratar todo e qualquer trabalhador da empresa como “insider” pela definição jurídica do termo em inglês. O “insider” é todo funcionário com acesso a informações estratégicas e financeiras que possam influir de modo ponderável na situação de uma empresa e, por conseguinte, no valor da ação (em geral, o status é conferido apenas a membros da alta administração). Abrir os livros dessa forma foi uma tacada arriscada, criticada por subscritores da empresa e pela SEC, a comissão de valores americana. Mas os líderes da Athenahealth queriam que todo funcionário fosse um insider não só no sentido regulamentar; queriam que estivessem totalmente envolvidos no negócio.

Saber ouvir. Um líder que leva o diálogo organizacional a sério sabe quando parar de falar e começar a ouvir. Poucos comportamentos contribuem tanto para a intimidade do diálogo quanto escutar aquilo que o outro diz. Prestar atenção de verdade indica o respeito por gente de todo escalão e cargo, curiosidade e até um grau de humildade.

James E. Rogers, presidente da americana Duke Energy, instituiu uma série de “sessões de escuta” quando comandava a Cinergy (que mais tarde se fundiu à Duke). Em reuniões de três horas de duração com grupos de 90 a 100 administradores, Rogers pedia que todo participante trouxesse à luz questões urgentes. Nessas discussões, ficava sabendo de coisas que poderiam muito bem ter escapado a sua atenção. Numa sessão, por exemplo, um grupo de supervisores apontou um problema ligado a disparidades salariais. “Você sabe quanto tempo teria levado para isso vir à tona na organização?”, pergunta Rogers. Tendo ouvido o problema diretamente da boca do pessoal atingido, o executivo pode instruir o departamento de RH a buscar de imediato uma solução.

Entrar no campo pessoal. Rogers não só pediu que as pessoas apontassem problemas na empresa, mas também quis ouvir sua opinião sobre o próprio desempenho. Numa sessão, pediu que os funcionários o avaliassem em uma escala de A a F. As notas, dadas em caráter anônimo, surgiram imediatamente numa tela visualizada por todos. Embora os resultados fossem basicamente bons, menos da metade do pessoal deu nota A ao chefe. Rogers levou o resultado a sério e passou a realizar o exercício regularmente. Também começou a lançar perguntas de resposta livre sobre seu desempenho. Ironicamente, descobriu que a “comunicação interna” era a área na qual o maior número de participantes achava que ele tinha espaço para melhorar. Enquanto tentava se aproximar do pessoal por meio do diálogo organizacional, um quinto das pessoas seguia instando Rogers a se aproximar ainda mais. Escutar de verdade significa aceitar o bom e o ruim, ouvir a crítica mesmo quando é direta e pessoal — e até quando quem a faz trabalha para você.

Na Exelon, empresa americana de energia com sede em Chicago, uma forma profundamente pessoal de diálogo organizacional surgiu de um projeto voltado a tornar os valores da empresa palpáveis para o pessoal. Declarações de valores não costumam contribuir muito para gerar intimidade; volta e meia são vistas como mero discurso. A Exelon fez um teste com a comunicação sobre diversidade, um valor fundamental na empresa: numa série de vídeos curtinhos — simples, despretensiosos, sem altas produções nem roteiro —, altos dirigentes da empresa deram um relato muito pessoal daquilo que a diversidade significava para eles. Falaram de raça, orientação sexual e de outros temas que raramente são discutidos em empresas. Ian McLean, na época executivo de finanças da Exelon, falou da infância na Inglaterra, numa família da classe operária de Manchester, e do preconceito sentido. Em resposta a uma pergunta sobre um momento em que se sentiu “diferente”, falou de quando foi trabalhar em um banco onde a maioria dos colegas vinha de famílias de alta renda: “Meu sotaque era diferente (…). Eu não era incluído, não era convidado, era levado a achar que não era tão inteligente quanto eles (…). Não quero, nunca, que alguém se sinta assim perto de mim”. Esse tipo de relato, sem floreios, causa forte impressão nos trabalhadores.

Interatividade: promova o diálogo

Uma conversa pessoal envolve, por definição, uma troca de comentários e perguntas entre duas ou mais pessoas. Uma única pessoa falando não é, obviamente, uma conversa. O mesmo vale para o diálogo organizacional, no qual o líder fala “com” os trabalhadores — e não só “para” eles. Essa interatividade torna a conversa aberta e fluida, em vez de fechada e impositiva. Implica abandonar a simplicidade do monólogo e abraçar a vitalidade imprevisível do diálogo. A busca da interatividade reforça a intimidade e nela se apoia: tentativas de reduzir a distância entre trabalhadores e líderes serão infrutíferas se o pessoal não contar com as ferramentas e o apoio institucional de que precisa para abrir a boca e (quando pertinente) dar a réplica.

A busca de uma maior interatividade reflete, em parte, uma mudança no uso de canais de comunicação. Por questões tecnológicas, durante décadas era difícil ou mesmo impossível promover a interação em organizações acima de certo porte. Veículos usados por empresas para atingir escala e eficiência na comunicação — meios impressos e radiodifusão, em particular — eram unidirecionais. Mas novos canais vieram subverter essa estrutura de mão única. Tecnologias sociais dão a líderes e a trabalhadores a capacidade de imbuir o ambiente organizacional do estilo e do espírito da conversa pessoal.

Só que a interatividade não é questão apenas de identificar e implantar a tecnologia certa. Igualmente importante — se não mais — é reforçar mídias sociais com uma mentalidade social. Muitas vezes, a cultura reinante na organização se opõe a qualquer tentativa de transformar a comunicação interna em uma via de duas mãos. Para muitos executivos e gerentes, é difícil resistir à tentação de tratar todo meio a seu dispor como um megafone. Em certas empresas, no entanto, os líderes conseguiram instalar uma cultura genuinamente interativa. Ali, valores, normas e hábitos criam um ambiente favorável ao diálogo.

Para ver como funciona a interatividade, peguemos o caso da Cisco Systems. Como é sabido, a Cisco fabrica e vende vários produtos englobados na categoria de tecnologias sociais. Ao empregá-los internamente, seu pessoal tirou proveito dos benefícios da comunicação bidirecional de alta qualidade. Um produtos desses, o TelePresence, transmite feeds de vídeo entre distintas localidades para simular uma reunião em pessoa. Uma série de grandes telas cria um efeito envolvente; mesas de reunião especialmente projetadas (em uma configuração ideal) se espelham para que os participantes sintam como se estivessem à volta de uma mesma mesa. De certo modo, é uma versão melhor de um chat em vídeo pela internet, sem atrasos e saltos que em geral prejudicam essa modalidade. Acima de tudo, resolve a questão crítica da escala visual. Quando foram estudar interações remotas, os engenheiros da Cisco descobriram que, se a imagem de uma pessoa na tela for inferior a 80% de seu tamanho real, quem a vê se envolve menos ao falar com a pessoa. No TelePresence, os participantes aparecem em tamanho real. Um pode olhar o outro no olho.

Embora seja uma ferramenta tecnológica sofisticada, o que o TelePresence permite é reinstaurar a troca imediata, espontânea. Randy Pond, vice-presidente executivo de operações, processos e sistemas da Cisco, acha que esse meio de interação traz o benefício da conversa “toda” — conceito que nos explicou ao relatar um episódio ocorrido ali dentro. Certo dia, sentado à mesa para uma videoconferência, Pond via a imagem em vídeo de vários colegas na tela do computador. Foi quando fez um comentário e um dos participantes “levou as mãos à cabeça” — supostamente num gesto de desânimo, talvez sem considerar que Pond podia vê-lo. “Estou te vendo”, disse Pond. “Se não está de acordo, diga.” Só então Pond conseguiu conversar com o cético colega para desvendar a “história toda”. Uma forma menos interativa de comunicação poderia até ter produzido essa informação ao final, mas de forma bem menos eficiente.

No cerne da cultura de comunicação da Cisco está o presidente, John Chambers, que mantém vários fóruns de contato com o pessoal. A cada dois meses, por exemplo, Chambers faz um “chat de aniversário” aberto a qualquer funcionário da empresa cujo aniversário caia naquele intervalo de dois meses. Altos gerentes não são convidados, para que sua presença não impeça os participantes de falar abertamente. Chambers também grava um videoblog uma vez por mês — uma mensagem breve e improvisada transmitida por e-mail a todos os funcionários. O uso do vídeo permite que fale com o pessoal de modo direto e informal, sem roteiro — o que sugere imediatismo e gera confiança. E, apesar da natureza inerentemente unidirecional do videoblog, Chambers e a equipe tornaram o recurso interativo ao aceitar comentários do pessoal não só em texto, mas em vídeo também.

Inclusão: amplie o papel do trabalhador

Quando é boa, a conversa pessoal promove a igualdade de oportunidades. Permite que o controle do teor da discussão seja compartilhado pelos participantes. Com isso, cada um pode colocar as próprias ideias — e, aliás, toda sua essência — na arena da conversação. Na mesma veia, o diálogo organizacional exige que os trabalhadores participem da geração do conteúdo que compõe a história da empresa. Ao computar o trabalhador como um comunicador oficial ou semioficial da organização, um líder que inclui os outros converte essa pessoa num interlocutor de pleno direito. No processo, eleva o grau de envolvimento emocional do trabalhador com a vida na empresa em geral.

A inclusão acrescenta uma dimensão crítica aos elementos da intimidade e da interatividade. Enquanto a intimidade envolve o esforço do líder para se aproximar do pessoal, a inclusão tem a ver com o papel que o trabalhador exerce nesse processo. Além disso, amplia a prática da interatividade ao permitir que o funcionário também dê ideias — em geral por canais oficiais da empresa —, em vez de simplesmente criticar as que outros apresentam. Permite que atue como um “provedor de conteúdo” na linha de frente.

No modelo típico de comunicação interna, altos executivos e profissionais da comunicação monopolizam a criação de conteúdo e mantêm um rígido controle sobre o que todo mundo escreve ou diz em canais oficiais da empresa. Já quando reina um espírito de inclusão, funcionários engajados podem adotar papéis novos, importantes, criando eles próprios conteúdo e agindo como embaixadores da marca, formadores de opinião e narradores.

Embaixadores da marca. Quando sente apreço pelos produtos e serviços da empresa, o trabalhador vira um representante em carne e osso da marca. Isso pode ocorrer de forma natural — muita gente ama o que faz e fala sobre isso até nas horas vagas. Mas certas empresas trabalham para promover essa conduta. A Coca-Cola, por exemplo, criou um programa formal de embaixadores para incentivar os funcionários a promover a imagem e a linha de produtos da empresa no discurso e na prática. A intranet da Coca-Cola traz recursos como uma ferramenta que conecta funcionários a atividades de voluntariado patrocinadas pela empresa. O núcleo do programa é uma lista de nove comportamentos típicos do embaixador, entre eles ajudar a empresa a “vencer em pontos de venda” (ajeitando os produtos da marca em gôndolas no varejo, por exemplo), transmitindo “leads” de vendas e informando casos em que um varejista ficou sem um produto da marca.

Formadores de opinião. Para chegar à liderança do mercado em uma atividade fundada no conhecimento, a empresa precisa contar com consultores ou profissionais da casa para elaborar discursos, artigos, ensaios e outros materiais. Muitas vezes, no entanto, as ideias mais inovadoras surgem nos recônditos da organização, onde o pessoal desenvolve e testa novos produtos e serviços. Dar poder a essa turma para criar e promover um material formador de opinião pode ser uma saída rápida e inteligente para turbinar a reputação da empresa entre atores de peso no setor. Nos últimos anos, a Juniper Networks patrocinou iniciativas para tirar potenciais formadores de opinião dos laboratórios e escritórios da empresa e levá-los a fóruns públicos onde possam exibir seus dotes intelectuais a especialistas do setor e clientes. Os engenheiros da empresa estão trabalhando na próxima leva de silício e hardware de sistemas e podem dar insights pertinentes sobre tendências. Para difundir essa perspectiva entre públicos relevantes, a Juniper despacha o pessoal para congressos nacionais e internacionais de tecnologia e promove encontros com clientes em centros de briefing da empresa.

Narradores. Embora as pessoas estejam acostumadas a ouvir profissionais de comunicação narrar episódios sobre uma empresa, não há nada como ouvir uma história diretamente da linha de frente. Quando um trabalhador fala por experiência própria, sem retoques, a mensagem ganha vida. A EMC, gigante da armazenagem de dados, está sempre pedindo histórias ao pessoal. Líderes buscam no trabalhador ideias para melhorar os resultados e opiniões sobre a empresa em si. A meta é incutir a noção de que toda ideia, não importa de onde venha, é bem-vinda. Um exemplo: em 2009, a empresa publicou o The Working Mother Experience. É um livro de luxo, de 250 páginas, escrito por e para gente da EMC. O tema? Como ser uma profissional de sucesso na empresa e, ao mesmo tempo, uma boa mãe. O projeto, surgido na linha de frente, foi defendido por Frank Hauck, então vice-presidente executivo de marketing global e qualidade ao cliente. Não é incomum uma empresa grande como a EMC produzir um livro para se promover, mas aquela não foi uma iniciativa de comunicação corporativa; foi, antes, um projeto criado e liderado por funcionários. Dezenas de trabalhadores da EMC também mantêm blogs, muitos em plataformas públicas. Ali, expressam uma opinião sem filtros sobre a vida na empresa e trocam ideias sobre tecnologias.
















Obviamente, a inclusão significa que executivos precisam ceder uma boa dose de controle sobre como a empresa é representada no mundo lá fora. Mas o fato é que mudanças culturais e tecnológicas derrubaram esse controle de qualquer maneira. Querendo ou não, qualquer um pode manchar (ou melhorar) a reputação da empresa sem nem levantar da mesa (basta enviar por e-mail um documento interno a um repórter, blogueiro ou a um grupo de amigos, ou dizer o que pensa em um fórum na internet). Logo, o líder que inclui está fazendo de uma necessidade uma virtude. Scott Huennekens, presidente da Volcano Corporation, sugere que uma abordagem mais frouxa à comunicação deixou a vida organizacional menos sufocante e mais produtiva do que no passado. O livre fluxo de informações cria um espírito mais livre. Certas empresas tentam, sim, definir expectativas básicas. A Infosys é uma delas. Ciente que não pode controlar a participação de trabalhadores em redes sociais, a empresa autoriza o pessoal a discordar — mas pede que, no ato, não sejam desagradáveis.

E, muitas vezes, o líder descobre que um sistema de autorregulação pelo trabalhador preenche o vazio deixado pelo controle centralizado. Alguém dá uma declaração ultrajante, a comunidade responde e a opinião geral acaba rumando de volta para o centro.


Intencionalidade: promova uma agenda

Para ser realmente fértil e gratificante, uma conversa pessoal será aberta, mas não sem rumo; os participantes terão uma noção daquilo que esperam atingir. Podem estar ali para entreter, convencer ou aprender. Na ausência dessa intenção, a conversa vai para lá e para cá sem norte, ou chega a uma encruzilhada. A intenção co

nfere ordem e sentido até à mais livre e divagadora das conversas. Esse princípio também vale para o diálogo organizacional. Com o tempo, as muitas vozes que contribuem para o processo de comunicação em uma empresa devem convergir para uma visão única do propósito da comunicação. Em outras palavras: o diálogo travado dentro de uma empresa deve refletir uma agenda comum, alinhada com os objetivos estratégicos da empresa.

A intencionalidade difere dos outros três elementos da conversa organizacional em um aspecto fundamental. Enquanto a intimidade, a interatividade e a inclusão servem para liberar o fluxo de informações e ideias dentro da empresa, a intencionalidade traz uma medida de conclusão ao processo: permite que líderes e trabalhadores cheguem a ações estrategicamente relevantes a partir do estica e puxa da discussão e do debate.

A intencionalidade do diálogo exige que líderes transmitam princípios estratégicos não só com a enunciação desses princípios, mas com sua explicação — que gerem consentimento em vez de impor a aceitação. Nesse novo modelo, o líder conversa de forma extensa e explícita com o pessoal sobre a visão e a lógica na base das decisões tomadas pela administração. Como resultado, gente em todos os níveis adquire uma visão panorâmica da posição da empresa no entorno competitivo. Em suma, adquire “fluência” em questões de estratégia organizacional.

Uma maneira de ajudar o trabalhador a entender a estratégia da empresa é permitir que tenha um papel em sua criação. A equipe de liderança na Infosys começou a incluir um amplo leque de funcionários no processo anual de desenvolvimento da estratégia. No final de 2009, quando começaram a traçar a estratégia organizacional para o exercício fiscal de 2011, líderes da Infosys chamaram gente de todo escalão e divisão da empresa para participar. Kris Gopalakrishnan, cofundador e copresidente-executivo, explica que o pessoal foi instado a dar ideias sobre “tendências transformadoras (…) que estariam afetando a clientela”. Usando essas ideias, planejadores estratégicos da Infosys chegaram a uma lista de 17 tendências, que vão desde o crescimento de mercados emergentes à crescente ênfase na sustentabilidade ambiental. Foi criada, então, uma série de fóruns online nos quais o pessoal poderia sugerir como casar cada tendência com soluções ao cliente que a empresa pudesse oferecer. Redes tecnológicas e sociais permitiram a participação das bases em toda a Infosys.

Em 2008, a Kingfisher plc, terceira maior rede de lojas de construção e reforma do mundo, começou a executar uma nova estratégia para transformar um apanhado de divisões de negócios historicamente independentes em “uma equipe”, em parte por meio do diálogo organizacional deliberado. Para lançar a iniciativa, os líderes da empresa fizeram um evento de três dias em Barcelona para executivos de varejo. No segundo dia, todos participaram de uma sessão de 90 minutos batizada de Share at the Marketplace (projetada para recriar um clássico bazar mediterrâneo ou do Oriente Médio). Trajando aventais, um grupo de participantes — os “fornecedores” — se dividiu pelas 22 barraquinhas da feira, todos prontos para “vender” uma prática de negócios criada por gente em seu setor da organização Kingfisher. Eram, basicamente, vendedores de ideias.

Outra turma — com integrantes do comitê executivo — agiu como facilitadora, circulando pelos corredores e distribuindo palavras de incentivo. O terceiro e maior grupo fez o papel de “compradores”: pulando de barraca em barraca, conferindo a “mercadoria” e, aqui e ali, “comprando” uma ideia. Com um talãozinho de cheques criado especialmente para a feira, os compradores podiam preencher até cinco folhas, cada um, para pagar por bens dos fornecedores. Uma operação dessas só tinha valor ali naquela sessão, mas transmitia uma forte mensagem para fornecedores: o que você está me contando é impressionante. A essência do feirão foi a troca de melhores práticas entre pares em um ambiente informal, caótico, barulhento. Mas a ideia também foi tratar o diálogo como um meio para atingir um fim — usá-lo para promover o alinhamento estratégico de um grupo diversificado de participantes.

Em toda empresa há diálogo, ainda que o fato não seja reconhecido. Sempre foi assim. Hoje, porém, a conversa tem o potencial de chegar muito além das quatro paredes da empresa. E está, basicamente, fora de seu controle. Um líder inteligente acha maneiras de usar esse diálogo — de gerenciar o fluxo de informações de forma honesta e aberta. A difusão unidirecional de mensagens é uma relíquia. Um material matreiro de marketing tem efeito mínimo tanto sobre o trabalhador como sobre o cliente. Já se a comunicação for íntima, interativa, inclusiva e intencional, as pessoas vão ouvir.

Bois Groysberg é professor de administração na Harvard Business School, nos EUA.

Michael Slind é escritor, editor e consultor de comunicação. Os dois são autores de Talk, Inc.: How Trusted Leaders Use Conversation to Power Their Organizations (Harvard Business Review Press, 2012).



Fonte: http://hbrbr.com.br/lideranca-e-dialogo/

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