Como a vida moderna está esgotando o espaço da sua memória

Os excessos de trabalho, de ansiedade e de estresse podem afetá-lo mais do que você imagina. Mas há maneiras de manter sua memória saudável.

Junte os cacos e mantenha a cabeça no lugar. (Fotos de Gustavo Pitta sobre foto de David Ryle/Getty Images)
Cadê a chave do carro? Onde guardei meu celular? O almoço com os clientes ficou marcado para que horas? Qual é mesmo o nome do gerente do banco?
Todos os pequenos lapsos de memória que acontecem no cotidiano podem ter relação direta com o modo de vida que se leva, atualmente, nas grandes cidades.
Muita concorrência no trabalho, horas de trânsito, agenda cultural intensa… O preço de se viver no centro urbano acaba sendo alto demais.
Ficar desmemoriado não é mais só um privilégio dos idosos. Jovens adultos sofrem cada vez mais com lapsos de memória. Porém, os motivos dos esquecimentos são diferentes. Um é o desgaste natural da engrenagem do organismo. O outro é o acúmulo de tarefas e o excesso de informações para conciliar.
Tente visualizar que seu cérebro é dividido por pastas de arquivos, com um número considerável de gigabytes de armazenamento. Ao longo da vida, você já largou a chave do carro em 100 mil lugares. Imagine, então, se você fosse capaz de lembrar todos. Calcule a quantidade de informação inútil que ficaria armazenada na cabeça.
Para não ter esse problema, o cérebro criou uma forma de zerar essa pasta sem prejudicar todo o HD. Ele consegue separar o que pertence à memória imediata, como o que você comeu no almoço de ontem, e o que vai para a memória de longo prazo, como o aprendizado de um novo idioma e até a lembrança da sua primeira transa.
O problema é que ter uma rotina estressante atrapalha todo o sistema de controle da memória imediata e pode deixá-la curta demais. É melhor você anotar as dicas a seguir para não esquecê-las mais tarde.

A culpa é dos excessos

A legislação brasileira (Consolidação das Leis do Trabalho) prevê jornada diária de oito horas – o que nem sempre acontece na prática. Você cumpre o expediente na risca, mas aqueles relatórios que levou para casa também são considerados trabalho, e vai mantê-lo ocupado por mais horas.
Resultado: você fica sem tempo de distração, não curte a família e/ou amigos e adia a hora de ir para a cama, sendo que precisa acordar no horário de sempre no dia seguinte. Nessa toada, a qualidade do sono é a primeira a sofrer: a cabeça não teve tempo de desligar.
Outro exemplo de como as “facilidades” das metrópoles são prejudiciais: academias que funcionam 24 horas por dia. Com elas, você não tem desculpas para faltar no treino – mesmo quando o dia foi exaustivo e você está só o pó para malhar.
Essa disponibilidade de funcionamento não deixa margens para desculpas e, pior, o fazem sentir culpado por tamanha vagabundagem! Então, você vai treinar e fica mais exausto do que já estava.
Para estar renovado e pronto para um novo dia, a Academia Americana de Medicina do Sono recomenda que se durma de sete a oito horas por noite. Ao encurtar esse tempo por conta dos compromissos, o organismo começa a trabalhar no modo “sobrecarregado”, pois está realizando um esforço mental e físico sem o intervalo de recuperação.
Calma, isso não quer dizer que você precise parar com os treinos. Muito pelo contrário: exercitar-se faz bem para a memória. A saída é começar a administrar melhor o ritmo do seu dia a dia, organizar seu tempo e ficar atento ao excesso de trabalho e à privação de sono, que podem ser as causas das suas queixas de esquecimentos.

A solução está longe da farmácias

Distúrbios psiquiátricos como depressão e ansiedade também são apontados como responsáveis por causar falhas na memória. Isso se deve à medicação, que, entre os efeitos colaterais, causa letargia e a diminuição dos reflexos motores (é como se você estivesse embriagado).
Tanto que os médicos indicam que os pacientes não dirijam nem operem máquinas nos primeiros dias de medicação. “A maioria das pessoas toma remédios apenas quando em crise. A automedicação é perigosa e pode levar à intoxicação e colocar a vida em risco”, diz Marina Arnoni Balieiro, psicóloga do Complexo Hospitalar Edmundo Vasconcelos, em São Paulo.
Calmantes, relaxantes musculares, analgésicos e outros remédios que causam sonolência (como antialérgicos) atuam nas sinapses cerebrais e interferem no circuito da memória. Essa pane pode explicar alguns lapsos e até a estranha sensação de esquecer o que se está fazendo em questão de segundos.
Preste mais atenção. Assim, as peças do quebra-cabeça começam a se encaixar. (Gustavo Pitta/David Ryle/Getty Images)

É melhor estar atento

Se você não toma essas medicações, mas sente que sua memória está deixando a desejar, o problema pode estar na sua atenção. Ou melhor, na falta dela.
O mecanismo é bem simples: se não estiver focado a uma determinada informação, ela não será gravada pelo cérebro. Uma vez não gravada, vai ser impossível conseguir recuperá-la mais tarde. Com isso, a memória leva toda a culpa quando, na verdade, quem falhou foi sua concentração.
Para conseguir cumprir todas as obrigações cotidianas no menor tempo possível, a pressa tem feito as pessoas andarem cada vez mais distraídas – e até mais perturbadas.
Com muitos afazeres para conciliar, é difícil focar exclusivamente em uma atividade. A saída encontrada é realizar um monte de coisas ao mesmo tempo. Resultado: correria, cansaço e estresse.
Esses fatores tiram o foco necessário para gravar as informações e, sem estar devidamente concentrado, a memória não processa os dados. É por isso que você não se lembra onde largou a chave do carro, onde enfiou o celular, a hora marcada daquele almoço de negócios, nem o nome do gerente do banco (bem, esse lapso pode ser bom…).

Nem tudo está perdido

Uma das medidas mais indicadas pelos médicos para fortalecer a memória é bastante prazerosa: conseguir manter o convívio social ativo.
“As relações afetivas estimulam a troca de experiências. Isso ativa as lembranças e mantém o funcionamento saudável do cérebro”, explica Alexandre Leopold Busse, geriatra do Hospital Sírio-Libanês, em São Paulo, e um dos coordenadores do Programa Cérebro Ativo, iniciativa que ajuda adultos a partir dos 30 anos a melhorar o desempenho cerebral em atividades cotidianas.
Por incrível que pareça, a internet e a tecnologia podem ser aliadas da memória. Ao descarregar informações triviais no celular e em outros aparelhos eletrônicos, seu cérebro fica com mais espaço livre para questões urgentes ou que tenham maior relevância.
Por exemplo: você não precisa mais se preocupar em lembrar o aniversário dos amigos (agradeça ao Facebook), nem o caminho para chegar à casa do seu amigo (graças ao Waze).
Nas redes sociais, você pode manter um contato diário com amigos e familiares, ver o que eles compartilham e compartilhar as próprias experiências, o que contribui para aumentar seu convívio social, afastar seu isolamento. Consequentemente, formam-se novas redes neurais no cérebro, o que mantém a memória fortalecida.
A partir de agora, a happy hour acaba de ganhar status de obrigação. É para o bem da sua saúde, oras!

Memória tinindo

O que você precisa saber para fugir da ala dos esquecidos
Tenha mais tempo para a diversão
Manter uma vida social ativa, ir ao cinema, ver os amigos, dar risada – tudo isso estimula a formação de lembranças saudáveis, que, por sua vez, botam a memória para funcionar.

Tire o corpo da inércia
Faça algum tipo de exercício: musculação na academia, lutas no ringue, caminhada ao ar livre, ciclismo… O importante é manter-se em movimento.

Siga uma alimentação equilibrada
A falta de vitamina B12 causa falhas na memória. Por isso, inclua no cardápio carnes como fígado de boi e coração de galinha, peixes gordos como salmão e truta, mariscos, queijos e ovos.

Seja bom de cama
Tente dormir ininterruptamente de sete a oito horas por noite. Insônia, apneia do sono e outros transtornos noturnos atrapalham o repouso do organismo. Sem descansar, o cérebro não recarrega as energias necessárias para que os neurônios relacionados à memória trabalhem com eficiência máxima.

Domine seu celular
Coloque seu smartphone para trabalhar para você. Crie o hábito de alimentá-lo com seus compromissos, lembretes, horários e até as ideias para aquela sua reunião de negócios.


Por: Sophia Cury
Fonte: https://vip.abril.com.br/comportamento/como-a-vida-moderna-esta-esgotando-o-espaco-da-sua-memoria/

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