Do que você é capaz? (estrelando Steve Jobs e... Chapolin!)

"Um ser humano deve ser capaz de trocar uma fralda, planejar uma invasão, matar um porco, comandar um navio, projetar um edifício, escrever um soneto, fazer a contabilidade, construir uma parede, cuidar de um ferimento, consolar os que estão para morrer, receber ordens, dar ordens, cooperar, agir sozinho, resolver equações, analisar um novo problema, adubar a terra, programar um computador, cozinhar uma refeição saborosa, lutar eficientemente, morrer galantemente. Especialização é para insetos."
Outro dia escrevi sobre o AC/DC, e sobre a vantagem competitiva de fazer sempre a mesma coisa e sempre muitíssimo bem, com foco, no capricho, sem distrações. Como, outro exemplo, Roberto Bolaños, o Chaves, também conhecido como Chapolin Colorado.
A repercussão foi grande. Mas umas poucas pessoas não entenderam direito meu ponto, ou eu que não soube me comunicar tão bem como gostaria. Ter foco na sua atividade, na sua expertise, na sua marca, não quer dizer sempre tocar o mesmo samba de uma nota só. Ter interesses variados, gostar de fazer coisas bem diferentes umas das outras, seja na vida pessoal ou no trabalho, não é sinal de dispersão. Pelo menos não necessariamente.
E quando se trata de uma pessoa no início da sua vida profissional, mais ainda é importante experimentar muita coisa diferente. E não só "o que o mercado exige". Quem é que vai saber o que o mercado vai exigir daqui dez, vinte, trinta anos?
Gosto muito de uma história sobre Steve Jobs (e não estou aqui beatificando Jobs, que tinha qualidades e defeitos, como todo mundo; mas ninguém negará que foi um baita de um empresário). Antes de fundar a Apple, garotão hippie meio sem objetivo na vida, Steve mergulhou no budismo. Até acabou visitando a Índia. Seu mestre zen era japonês, e Steve se dedicou muito a uma atividade que monges budistas praticam muito no Japão: a caligrafia. É, Steve estudou japonês, e aprendeu a escrever em japonês, usando aquelas penas.
E foi por isso que quando estava criando um computador, lhe ocorreu que o usuário deveria ter a possibilidade de personalizar as letras dos textos. Mudar o tamanho, a fonte, colocar negrito. Isso foi um grande diferenciador do Macintosh, e um passo gigantesco no caminho da personalização dos nossos aparelhos eletrônicos, seja o computador ou, hoje, o celular. Ou seja: estudar budismo, e estudar caligrafia japonesa, coisas que jamais estariam em nenhum curso de engenharia eletrônica, foram um diferencial muito grande na hora de criar um... computador!
É por isso que acho má idéia essa reforma do Ensino Médio, que elimina os cursos de artes do Ensino Médio. Tratar arte como supérfluo é uma incompreensão do processo de criação, e aliás do papel da Economia Criativa no nosso mundo atual e futuro. Recentemente vi um papo muito interessante sobre o papel da arte no desenvolvimento da Ciência (!), entre dois caras muito interessantes: o astrofísico Neil DeGrasse Tyson e o músico David Byrne. Recomendo, vá atrás. Aliás é ruim tirar educação física também... nós somos nosso corpo, pô! Não só o que carregamos no cérebro.
Preparar os jovens para o mercado é impossível. Temos que preparar os jovens para a vida, para os desafios que podemos prever e os que nem podemos sonhar. E se você é um jovem profissional, mesma coisa. Se bem que hoje a gente tem que se preparar para o imprevisível em qualquer idade, o tempo todo. Já passei dos 50, e se não aprender a fazer coisas novas a cada ano que passa, vou aprender o quê? A viver de brisa?
O que não dá é para ficar neurótico / paranóico com isso. Só ler coisas que têm a ver com trabalho emburrece. Correr atrás da última novidade é esforço jogado fora. E ficar ligado o tempo todo no noticiário e discutindo nas redes sociais só gera stress e nada de produtivo. O Steve Jobs jogou bastante tempo fora, aprendendo a escrever em japonês. Você também pode desperdiçar seu tempo com alguma coisa "inútil", relaxe.
Sobre o texto lá no alto, é de autoria do Robert A. Heinlein, um dos maiores escritores de ficção científica do século 20. E reler essas linhas, "especialização é para insetos", me fez de lembrar de Chapolin, o gafanhoto... e do"chapulin", uma iguaria comum no México. Vendem saquinhos cheios de gafanhoto fritinho e salgado! Eu fui capaz de experimentar. Tem gosto de grama com sal!
Não sou capaz de planejar uma invasão e nem matar um porco, mas sou capaz de fazer algumas dessas coisas que o Heinlein cita. E muitas outras que ele nem cita. E serei capaz de coisas que nem eu sou capaz de imaginar. Nós todos somos múltiplos. Vamos em um minuto do Budismo à ficção científica ao Chapolin Colorado. Como diz a linda frase do poeta Walt Whitman, "I contain multitudes", eu contenho multidões...
E você? É capaz de quê?
Fonte:https://www.linkedin.com/pulse/do-que-voc%C3%AA-%C3%A9-capaz-estrelando-steve-jobs-e-chapolin-andr%C3%A9-forastieri

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